O coronavírus e a viralização das fake news

Por: Sergio Bialski

Há algumas semanas venho recebendo, principalmente em grupos de WhatsApp, uma enxurrada de informações sobre o tema coronavírus, a maior parte delas falsas, que chegam mesmo a atentar contra o bom senso. O que chama a atenção é o caráter supostamente científico de sua fundamentação, dando a impressão de autoridade e colocando em xeque o mais precioso bem que reveste a informação: a própria verdade!

Pesquisa divulgada no dia 13/2/2020, conduzida pela empresa de cibersegurança Kaspersky, revelou que 62% dos brasileiros não conseguem identificar uma notícia falsa. O estudo foi produzido para entender a probabilidade de a população se tornar vítima de um “iceberg digital” – sites aparentemente confiáveis, mas que compartilham dados errados – e analisou a atual situação da segurança dos internautas na Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México e Peru.

Em tempos de coronavírus, a incapacidade de buscar fontes confiáveis de informação acaba resultando num pânico generalizado a cada espirro que um estranho dá ao nosso lado ou ao vermos alguém usando máscara, e é comum que pessoas de boa-fé, que fazem parte de nosso círculo familiar e de amizades, sejam vítimas do vírus da desinformação, colaborando com a disseminação de notícias falsas.

Para a situação não fugir mais ainda ao controle, o Ministério da Saúde teve de criar um número de WhatsApp – (61) 99289-4640 – para que técnicos possam receber e analisar todo tipo de “informação viral” sobre o coronavírus. A iniciativa é promissora, e, no site do Ministério, as inverdades que circulam pelas redes sociais são comentadas de forma oficial e levam um selo de fake news (para conferir, acesse www.saude.gov.br/fakenews/coronavirus).

De memes a fotos, de vídeos a textos falsos, vivemos num mundo que parece exigir, a toda hora, que participemos de grupos e rodas virtuais contínuas de conversa, e, para manter o diálogo, há uma obrigação implícita de se manifestar sobre qualquer assunto. O que menos importa é compartilhar conteúdo relevante: o que vale mesmo, quase que numa brincadeira pueril, é não ficar em silêncio. Nessa busca contínua de aprovação social, somos complacentes diante de amigos, parentes e até de desconhecidos que nos enviam informações inverídicas, e, por razões de apego emocional, raras vezes repreendemos quem as envia.

Como diz o adágio popular, “que atire a primeira pedra” aquele que não foi complacente com algum conhecido ou familiar que compartilhou, nas últimas semanas, fake news sobre o coronavírus. Eis aqui alguns exemplos de fake news que todos nós pudemos ter visto ou recebido recentemente: Fake1: diz que fazer gargarejos com enxaguantes bucais ou enxaguar o nariz com solução salina ajuda a proteger contra o novo vírus; Fake 2: diz que é necessário evitar comida chinesa ou não comprar produtos da China e não receber correspondência deste país; Fake 3: diz que o uso de chá de abacate com hortelã, uísque e mel, vitamina C com zinco, etc. pode prevenir e combater o coronavírus; Fake 4: em formato de vídeo, mostra um suposto químico afirmando que álcool gel não tem eficácia, recomendando vinagre para prevenir o contágio; Fake 5: em formato de vídeo, mostra um homem sem máscara sendo cercado e preso na China, supostamente depois de ter sido barrado em uma blitz para detecção do coronavírus e não ter colaborado com os policiais.

Vou encerrar por aqui a lista contendo tudo o que recebi, mas você, caro leitor, facilmente poderá completá-la com tudo o que também recebeu. A pergunta que fica é: por que tão poucas pessoas se rebelam contra o conteúdo recebido? Por que riem solitariamente com aquilo que recebem e, pior, por que viralizam a desinformação?

Em entrevista à BBC News Brasil, em 2018, o dr. Cláudio Martins, médico e diretor da Associação Brasileira de Psiquiatria, afirmou que as pessoas que compartilham notícias falsas experimentam uma sensação de bem-estar semelhante à de usar drogas. Desse modo, a pessoa imagina que é portadora de uma novidade que deve ser contada com urgência (sentimento igual quando se ouve uma fofoca).

Independente das razões de natureza comportamental que levam à viralização das fake news, uma coisa é certa: vivemos numa sociedade que tem acesso à informação, como nunca antes se viu, mas o lado sombrio disso é que tanta informação disponível pode levar à desinformação. O combate a ela só será possível quando a educação digital fizer parte de nossa cultura e realidade, o que permitirá o aguçamento do senso crítico e o fortalecimento do espírito democrático e do compartilhamento responsável.