A batalha pela informação

Por: Sergio Bialski

“Na guerra, a verdade é a primeira vítima”.

Alguns atribuem essa conhecida frase ao senador americano Hiram Johnson; outros a Ésquilo, famoso dramaturgo da Grécia Antiga, reconhecido frequentemente como o pai da tragédia, que viveu por volta de 525/524 a.C. a 456/455 a.C.

De Ésquilo até hoje, estamos falando em cerca de 2.500 anos de História, e, curiosamente, hoje a guerra não precisa ter lanças, escudos, carruagens ou, muito menos, armas de fogo, podendo ser uma batalha pela informação.

No meio da maior pandemia já enfrentada pela humanidade, desde a gripe espanhola, assistimos a um duelo de proporções épicas entre a maior autoridade política do País, o presidente Jair Bolsonaro, e o maior ídolo da justiça brasileira e do combate recente à corrupção, o ex-ministro e ex-juiz federal Sergio Moro.

Moro, numa concorrida coletiva de imprensa, deixou a Nação estarrecida ao pedir demissão e fazer graves denúncias. Ao não concordar com a exoneração do diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, tornou pública a interferência política de Jair Bolsonaro em inquéritos do Supremo Tribunal Federal (STF), que a passos largos encurralam Carlos, Eduardo e Flávio. Um desses inquéritos envolve a disseminação de fake News em redes sociais e outro busca identificar os responsáveis pelas manifestações antidemocráticas que pediram a volta do AI-5 e o fechamento do Congresso e do Supremo.

Jair Bolsonaro, não se dando por vencido, fez um pronunciamento à Nação para, segundo suas próprias palavras, “restabelecer a verdade” sobre o pedido de demissão de Sergio Moro. Além de negar todas as acusações que lhe foram imputadas, contra-atacou dizendo que o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública aceitaria a substituição do diretor-geral da Polícia Federal, em novembro, desde que fosse indicado para uma vaga no STF.

Entre réplicas e tréplicas, de uma e de outra parte, é importante que se tenha em perspectiva um fato concreto: após menos de um ano e meio de governo, cai por terra o discurso de combate à corrupção que elegeu Bolsonaro. Cai por terra, também, o discurso de sempre privilegiar a competência técnica: a exoneração de Luiz Henrique Mandetta do Ministério da Saúde, poucos dias antes da demissão de Sergio Moro, explicitou bem a tendência de que, ao menor sinal de divergência, prevalece o adágio “pede pra sair”.

Poucas vezes vimos, na história política brasileira recente, um governo desnudar-se de forma tão clara, e em tão pouco tempo, e os reflexos disso aparecem nas pesquisas de opinião pública: pesquisa Datafolha publicada em 27/4/2020 – que entrevistou 1.503 brasileiros adultos em todas as regiões e estados do país e com margem de erro de três pontos percentuais – aponta que 52% dos entrevistados acreditam que Sergio Moro fala a verdade ao acusar Jair Bolsonaro e 20% acreditam que o presidente é quem fala a verdade. 6% não acreditam em nenhum dos dois e 3% acham que ambos estão certos. 19% não souberam responder.

Segundo os dados, 49% acreditam que o atual chefe do Executivo perdeu a capacidade de liderar o país e 45% acreditam que o presidente tem condições de ocupar o cargo. A pesquisa revela também que 38% acreditam que nunca é possível confiar numa declaração de Bolsonaro, 37% dizem ser possível confiar às vezes e 21% acham que dá para confiar sempre. O impacto da saída de Moro também abalou o grau de confiança no Governo Federal: 45% da população quer que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, aceite a abertura de um dos processos de impeachment protocolados contra o presidente. 48% rejeitam a medida. 6% não souberam ou não quiseram opinar. O apoio à renúncia é de 46%, contra 50% que rejeitam tal medida.

“Tenho que preservar minha biografia”, disse Moro ao anunciar a sua demissão. De fato, construir uma história de vida não é tarefa para amadores. O ex-ministro sabe bem que reputação é a mais relevante moeda de troca que temos, e que danos a ela podem causar o ocaso a marcas, carreiras e governos. Enquanto o presidente não aprender essa valiosa lição, continuará despencando nas pesquisas de opinião e correndo o sério risco de seu governo desaparecer, pois na batalha pela informação, o zelo por práticas éticas é uma necessidade de sobrevivência cobrada há tempos pela sociedade brasileira. E, nisso, Moro é imbatível.